terça-feira, abril 04, 2006

O Deputado Buda

“Não sou um ateu total, todos os dias tento encontrar um sinal de Deus, mas infelizmente não o encontro.”
José Saramago - Escritor português, 1922-?


Ricardo era um cara esperto. Surfista, maconherinho culto, logo leu um livro sobre budismo e filosofia para se tornar o maior comedor da praia. Garotas gostam de homens com conteúdo.
Aos 25 conhece uma psicóloga bonita e se casa. Acaba Direito e ingressa de vez na vida política.
Continuou esperto e aos 38 já era deputado federal, pai de uma linda polaquinha.
Como político era popular, moralista e católico. Votava contra os projetos a favor da legalização do uso de células-tronco para estudos aqui em nosso país. Seus eleitores diziam ser imoral “tirar a vida” de um embrião que possui 6, talvez 10 células. Ele concordava.
Como pai era sorridente, quase atencioso. Chegava atrasado nas apresentações de balé da filha. Numa dessas, foi tarde. A menina estava desmaiada a caminho do hospital.
Leucemia, disseram os médicos de São Paulo e Goiânia.
1 ano, condenaram os de Boston.
Ricardo só chorava e ia a outros médicos. Obcecado, acabara por ler sobre uma clínica pioneira lá da Inglaterra. O país já tratara alguns leucêmicos com uma terapia que mostrou cura em pacientes desiludidos. Células-tronco devolveram a vida para europeus doentes do sangue.
A mãe quis levar a menina para os doutores ingleses. O pai chega em casa e conversa com a psicóloga:
-Não sou um homem imoral. Vamos ficar por aqui e usar a medicina que não "tira vidas" para tratar os pacientes.
Os garotos ainda não haviam entrado na vida da polaquinha. Ela não havia entrado no colegial para escolher uma profissão e conversar sobre sexo no quarto das amigas. Estava só começando.
A Leucemia foi pontual. 1 ano.

6 comentários:

Alexandre Lucio Fernandes disse...

Nossa que trágico meu amigo Caio.
Caro Thiago, quer dizer que então a filha dele merecia morrer.
Não concordo. Uma coisa dessa não serve para mostrar para ele a funcionalidade das coisas.
Entretanto, chega a ser irônico a filha dele morrer.

Lamento.

PS: que pontualidade essa hein... me espantou. (risos)

ALF

Alfaia disse...

Uou!
Nada melhor do que tratar de hipocrisia com uma pitadinha de ironia.

Como primeira prostituição oficial, eu gostei.
Mesmo!

Se continuar assim, a casa renderá lucros.
:]

Anônimo disse...

Antes fosse o falso moralismo o objeto de todo esse falatório,
o problema de qualquer indivíduo preso a dogmas religiosos é a não aceitação do "outro", a não aceitação da natureza humana, que contrariamente, e "Graças a Deus" não é divina.
As células-tronco continuam
sendo pesquisadas, felizmente em alguns
países as barreiras religiosas foram quebradas, poderemos usufruir dos benefícios de todo um trabalho
que visa o somente o bem da humanidade, enquanto a "Salvação"
não vem.
[]'s
Bela dissertação.

Borba disse...

Rá, achei muito bom.
E o final, impactante, conciso e foda.
Acho que sempre que possível - sendo parente, aderente ou agregado - a gente tem que tentar ajudar as pessoas . No caso, tu deixou clara tua opinião, ainda demonstrando que o político b(p)ut(d)a parecia 'ser' religioso por conveniência. Votos...

Aliás, me lembrou de um episódio, 7° ou 8° série.
Na época, o assunto da moda era clonagem, e o amigo Mateus era um dos poucos da sala que levantava a voz pra defender o estudo das células-tronco. Talvez porque ele tivesse lido bastante sobre o assunto e queria demonstrar sua visão, talvez porque ele falasse demais mesmo... Ele defendia que através da multiplicação perfeita das mesmas poderia se ter uma resposta para vários tipos de doença. No que o seu amigo Caio de bate-pronto retrucou: Como, a resposta vai nascer colada nas células?
É, ele arrancou algumas gargalhadas, inclusive do PançaLucas, que gostava de chacotear o amigo Mateus.
E Mateus, apenas riu, sem graça.

:)

Hoje eu me lembro disso às gargalhadas.

Alfaia disse...

Paula, eu não sou autor do texto, mas como membro do blog, eu posso garantir que você tem tooodo o direito de expressar sua opinião. Até porque você levantou a mão, argumentou e assinou embaixo. E isso é ótimo.

Afinal, toda unanimidade é burra!

Anônimo disse...

muito bom...pena q não é de familia


kkkkk