quinta-feira, maio 22, 2008

Prática Civil II

Não encontrou as etiquetas. Droga! Tinha novamente esquecido de comprá-las.

Lembrou da facilidade com que esquecia das coisas, como no dia em que reencontrou num supermercado a garota por quem foi apaixonado durante todo o ensino médio, e não lembrou do nome dela. Ou ainda do aniversário de sua mãe, quando esqueceu de lhe mandar um cartão por e-mail.

Pôs o CD novo no som, pensando na necessidade estética de comprar um toca-discos, daqueles bem antigos. Folheou o livro, passando página por página, sentindo a textura do papel amarelado entre os dedos e o cheiro de coisa nova que tanto o inebriava.

O telefone começou a tocar. Deve ser engano.

Abriu uma gaveta. Etiquetas! Mas eram etiquetas rosas, guardadas há tempos. A maioria estava rabiscada com o mesmo nome feminino. Lembranças de uma garota por quem ele foi apaixonado durante todo o ensino médio.

Não gostava de etiquetas rosas, tinha que ser das amarelas. Nota mental: comprar etiquetas amarelas no próximo pedido.

O telefone continuava tocando.

segunda-feira, maio 12, 2008

Prática Civil I

Tentou, esforçou-se com sinceridade, mas não conseguiu lembrar da última visita que recebeu.

Enquanto o som da música preenche o espaço vazio da sala, ele se pergunta exatamente o porquê de identificar seus objetos pessoais com etiqueta amarela, com seu nome e sobrenome e, embaixo, seu endereço eletrônico.

Seria normal o procedimento, recomendável, inclusive, se ele não morasse sozinho. Nunca sai de casa, por isso não lê no ônibus. Não possui cachorro nem gato, nem planta nem pelúcia, nem parente nem amigo.

Só possui seu reflexo no espelho, com quem conversa todas as manhãs.

Batidas na porta. Uma encomenda por debaixo. CD de blues e um livro: pediu pela internet. Sorriu, empolgado. E retirou da gaveta algumas etiquetas amarelas, serviriam pra identificar alguns novos objetos pessoais.