sexta-feira, agosto 08, 2008

Prática Civil IV

A dúvida atual era se deveria atender ou não o telefone, que insistia em tocar. Deixaria as etiquetas pra depois.

Caminhou até a parede lado norte de sua sala, perto do telefone em cima da escrivaninha consumida pelo tempo e tirou a tomada da parede. Pronto, agora, no ar, só o blues.

Lembrou da água ebulindo na chaleira e deu uma corrida até a cozinha. Cansou, apesar de morar num quarto-e-sala de vinte e dois metros quadrados. A vida de recluso estava acabando com seu corpo. Café quente saindo, mais um dos seus vícios. Açúcar, outro.

Adorava olhar a fumaça se esvaindo pelo copo plástico. Lembrou de sua mãe, falando que beber café em copo plástico dá câncer, comprovado, passou no Jornal da TV. A velha tinha aquelas manias antigas e estranhas: leite com manga faz mal, feijão com banho também, camisa ao avesso, trovão sem chinelo, tudo isso. Fosse pelas manias dela, e ele já estaria morto.

Se bem que, pensou, já estava.

Há tanto tempo não convivia com ninguém, tinha perdido a prática da civilidade. Sua vida parecia nada mais que um emaranhado de lembranças com cheiro de nostalgia. Convivia com ele só, seus CDs, seus livros, suas manias e suas etiquetas amarelas.

4 comentários:

Borba disse...

Temos que voltar a atualizar isso aqui. :)

Unknown disse...

ah-dorei!

a náusea! again!!

voltem a atualizar, please!

Alfaia disse...

Precisamos sim!

A Renata diz que esse personagem lembra um personagem de "A náusea", do Sartre.

já leu?

Borba disse...

Não, nunca li.
Nunca li Satre, mas jé li Nick-Náusea, serve?