segunda-feira, novembro 27, 2006

Segunda de manhã

Mal ele sabia como seria difícil acordar cedo novamente. O corpo já estava acostumado. Algo haver com relógio biológico, horas de sono e muito blá blá blá.
Relutante, entrou no chuveiro, água fria descendo pelo corpo.
Camisa, calça, tênis, corpo quente e copo gelado, leite sem açúcar, puro.
Tinha marcado 7h na Estação. Porque tão cedo meu Deus do céu?
Se arrependeu.
Mas ele não saberia chegar lá, Grasb, Cidade Baixa, calordusinferno e andanças mais. O combinado era ligar pro Preto assim que chegasse lá. Chegou, seven sharp. Assim fez, ligou.
Nada.
Preto safado!
Sentou e começou a esperar, enquanto via as pessoas passando agitadas e apressadas, pulsantes a caminho do trabalho. Vendedores de café e cigarro. Vendedores de água fazendo a festa.
Calordusinferno!
Via tudo, e mais que via, percebia. O menino chorão. A mãe chateada. O casal discutia já cedo. O suor correndo da testa do velho. O homem dormindo. Cada parte de cada mundo daqueles por momentos fez parte do seu mundo.
No mp3 player termina room on fire, que ele achava substancialmente melhor que o is this it (que seria mediano, não fosse por trying your luck e new york city cops).
Resolve ligar pro Preto de novo.
- Tô na Paralela! Engarrafamento da porra aqui!
Sabia! O Preto deve ter caído da cama, acordou ainda com a minha primeira ligação e vai demorar.
- Tudo bem. Tô aqui esperando – disse, taciturno.
Ia aproveitar pra estudar Marketing. Tinham uma apresentação complicada no dia posterior. Tirou as folhas da mochila e aumentou o volume do player.
Tinha começado Bonança.
Bonança seria o Ventura, não tivesse vazado na internet. Diziam que era só um ensaio. Diziam que seria o oficial. Verdade é que vazou e os caras mudaram alguma coisa entre letras e pouca coisa entre arranjos. Nada que representasse uma diferença escambrosa.
Estava macambúzio.
“... quem se atreve a me dizer...”.
“... e eu que já não quero mais...”.
Parou no primeiro paragrafo. O pé batia acompanhando o ritmo da bateria.
“...no copo deeee caaaféééé...”.

“...quero dançar com outro par, pra variar amor...”. Ficou triste. Lembrou de uma ex-namorada. Ele tocava essa música e ela chorava. Sempre.

“...moça, diz pra mim, como vai você...”.
As mãos espalmavam, a cabeça balançava, as lembranças vinham. Momentos.
O senhor do lado olhava estranho. O que será que se passa com esse garoto?
“...uuuuuh, aaaaaah, aaaaaah, aaaaaaah...”.
É cada maluco.
“...como é que um filho meu é tão diferente assim...”.
“...de onde vem a calma, daquele cara...”.

Tinha chegado ao fim da folha, e percebeu que tinha lido tudo, mas não tinha lido nada.
Los Hermanos sempre o deixou assim, a tal ponto de perder a concentração já fugidia.
Achou um pedaço de música que nunca tinha reparado. Sorriu.
Vinha vindo o Preto do outro lado, agitado como sempre, sorriso aberto mas olhar preocupado.
- Diga meu filho! Demorei?
- É... tem problema não, eu estava aqui estudando pra apresentação de amanhã...

sábado, novembro 18, 2006

Tinta preta pra escrever

Há muito reparei que o blogue anda meio lento, mal das pernas.
Eu, por uns tempos, dei uma diminuída desse mundo virtual, e como sempre foi normal pra mim, fiz uma reflexão do que realmente estava me levando a parar de escrever.
Fui pensar, matutar, macambuziar, e aí reparei numa coisa. Reparem:

Eu parei de reparar nas pessoas.

É, foi.
Eu, logo eu. O popular populista escrachado, que gosta de escrever sobre a senhora que rouba a bola dos guris, da sujeira da calçada no caminho pra aula, do garoto que se chamava Pipoca, ou da tia no ponto de ônibus que queria me casar com a filha dela.
Vim tentar entender, nesse escopo de incontáveis mudanças constantes, o que tinha causado essa mudança em especial.
Sempre pensei que eu, como estudante e como pessoa que gosta de Comunicação (não necessariamente um alguém comunicativo) deveria ser uma esponjinha, como sempre fui, absorvendo tudo sem se esquecer de filtrar. Sempre observador, de beira de olho, notando e anotando, pensando e medindo, escrevendo mentalmente tudo que se passava em volta de mim.

E aí pensei que uma coisa tem total relação com a outra, afinal, o que sempre deu carga pra minha caneta foi esse meu mundo cotidiano.
Não sei realmente o que freou essa característica, mas ontem eu acho que voltei ao normal quando me deparei com um ambulante vendendo água dentro do ônibus e senti vontade de escrever sobre o que vi.

Mas aí é história, quem sabe, pra um próximo post.

sábado, novembro 04, 2006

Eita porra!

Risos.
Eles entram ofegantes na sala de aula, suados, risonhos estranhos.
No ar o cheiro.
Logo após chega outro. - Vocês viram?
Olhares trocados. Olhares culpados.
Olhares irônicos, como se não soubessem de nada, não tivessem visto nada.
- Não.
- Não.
- Não.
- Vimos o que?
- Não?

Pausa. Volta.

Risos.
Eles entram no banheiro risonhos, risos sorrisos.
- Ahhhhhhh tá! Vai dizer que se ela viesse pra cima tu não fazia nada?
- Fazia, é claro que fazia!
- Fazia porra nenhuma que tu fazia rapá! O que que tu fazia?
- Aliviava a ponta do binga nela!
- Pfff....
- Tá, tá.
- Fazia sim, fazia sim. Quem não fazia era o Iã. Ele tirava o dele pra fora e começava a bater uma...
...

No banheiro, um espelho enorme, dois por um. Diziam que atrás dele tinha um cofre.

- Cofre?
- É, cofre.
- E por que ia ter um cofre atrás do banheiro masculino direito do 3° andar?
- Não sei.
- Não sabe?
- É, não sei.
- Então...?
- Não sei, ué.
- Então tá.

O espelho era pesado, mas eu conseguia. Era só dar uma afastada, dava pra olhar.

- Eita porra!

Pausa. Adianta.

- Não.
- É, não. O que foi?
- Sabem o espelho de dois por um do banheiro masculino direito do 3° andar?
...